Pensar em Ecologia integral, sonhar o futuro
Soa às vezes como um estribilho que estes são “tempos sombrios”. Mas não nos conformemos. ESPERANÇA é uma palavra para escrever em maiúsculas, para vermos na realidade mais do que as más notícias e razões de preocupação.
Rita Veiga, RCCC
31 de julho de 2024
Com a chegada das férias e fim do ano escolar, sente-se que termina um ciclo e isso leva a uma avaliação do que decorreu entretanto e do que foi marcante. A contragosto, apercebemo-nos de como o tempo passou e tanta coisa que desejávamos, e tínhamos esperado que mudasse, persiste e até se agravou ou passou a ter a companhia de outras más notícias. A destruição dos equilíbrios dos ecossistemas que nos permitem viver no planeta Terra é o maior problema e o mais exigente, mas vão-se somando situações e acontecimentos mais imediatamente esmagadores. São as crescentes desigualdades e o que isso acarreta, as guerras sem fim à vista, as catástrofes naturais múltiplas e cada vez mais intensas, os meses que sucessivamente são os mais quentes desde que há registos, o número de deslocados por causa do clima e da destruição das suas terras, mais os que fogem dos conflitos violentos ou procuram tão-só melhorar os meios de vida para si e para as suas famílias.
A tudo isto, as pessoas dão respostas muito diversas e em geral, com franqueza, ficam aquém do que podem e é necessário fazer. Algumas, talvez porque se sentem impotentes, atribuem de modo simplista a responsabilidade a outros, quer nas causas (demográficas, p.ex.) quer nas medidas a tomar (cabem aos políticos, claro), ou refugiam-se na negação, o que favorece os que desejam preservar atividades lucrativas e a sua exclusiva comodidade. Outras pessoas, porque já fazem alguma coisa, como separar o lixo, esquecem que, neste lado mais “acomodado” do mundo, é mesmo preciso mudar os estilos de vida, reduzir o consumo em todas as frentes, enfim conjugar sobriedade e partilha para melhorar de vida. Também há muitos ativistas que estão a fazer a diferença: uns tornam-se incómodos e pode-se questionar a sua eficácia; outros desenvolveram admiravelmente as mais diversas “boas práticas” e é lamentável que não sejam muito mais divulgadas. Requerem e merecem que sejamos mais inventivos também a unir esforços.
Por vezes, somos levados a alinhar mentalmente o que são as nossas ocupações, fazendo uma espécie de balanço, para perceber se tudo faz sentido. Já agora, recorde-se a máxima de Gandhi de que temos de ser a mudança que queremos ver no mundo, ou, pelo menos, não nos esquivarmos a contribuir para ela tanto quanto pudermos. Isto leva à questão de como fazer a diferença. Mudar depende de nós. E inclui uma muito maior participação cívica, na política mesmo, focada no bem comum, comprometida com os valores que colhemos no Evangelho e no pensamento social cristão.
Ainda há poucas semanas, o papa Francisco, falando na Semana Social dos Católicos, em Itália, declarou sem rodeios: “no mundo de hoje a democracia, digamos a verdade, não goza de boa saúde.” E mais adiante, veio a talhe de foice lembrar o compromisso dos cristãos, que devem olhar a realidade à luz do Evangelho, numa “atitude de responsabilidade em relação às transformações sociais […] onde quer que vivam e atuem, em qualquer parte do mundo”. Recomendou vivamente que sonhemos o futuro!
Viver a fé implica “ter a coragem de fazer propostas de justiça e de paz no debate público”; o amor político (cf. Fratelli tutti, 180ss.) “não se contenta com a preocupação pelos efeitos, mas procura enfrentar as causas”. E num tempo de caminho sinodal para pensar e atualizar o modo de sermos Igreja, diz-nos ainda Francisco: “Este é o papel da Igreja: envolver na esperança, pois sem ela administra-se o presente, mas não se constrói o futuro. Sem esperança seríamos administradores, equilibristas do presente, não profetas e construtores do futuro.” Este discurso, proferido em Trieste, no dia 7 de julho, encontra-se em https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2024/july/documents/20240707-trieste.html.
Soa às vezes como um estribilho que estes são “tempos sombrios”. Mas não nos conformemos. ESPERANÇA é uma palavra para escrever em maiúsculas, para vermos na realidade mais do que as más notícias e razões de preocupação. Então, e não é empolgante saber que o Criador sempre conta connosco, que o Espírito deseja levar-nos mais longe do que imaginávamos? A Laudato si’ contém umas ideias-chave para refletir sobre a intervenção de que não estamos dispensados:
«Na expectativa da vida eterna, unimo-nos para tomar a nosso cargo esta casa que nos foi confiada, sabendo que aquilo de bom que há nela será assumido na festa do Céu. Juntamente com todas as criaturas, caminhamos nesta terra à procura de Deus, porque, «se o mundo tem um princípio e foi criado, procura quem o criou, procura quem lhe deu início, aquele que é o seu Criador». Caminhemos cantando; que as nossas lutas e a nossa preocupação por este planeta não nos tirem a alegria da esperança.
Deus, que nos chama a uma generosa entrega e a oferecer-Lhe tudo, também nos dá as forças e a luz de que necessitamos para prosseguir. No coração deste mundo, permanece presente o Senhor da vida que tanto nos ama. Não nos abandona, não nos deixa sozinhos, porque Se uniu definitivamente à nossa terra e o seu amor sempre nos leva a encontrar novos caminhos. Que Ele seja louvado!» (LS 244-45)